Um levantamento inédito da Federação Brasileira de Gastroenterologia aponta que quase metade dos brasileiros sente algum sintoma de má digestão, como refluxo, azia e tosse seca.
A azia foi o sintoma mais relatado nas cinco regiões do país e o Nordeste apresentou mais relatos de sintomas, totalizando 48% das queixas. Os dados, segundo a entidade, ajudam a montar um perfil dessas doenças com um recorte nacional e servirão como base para o trabalho de especialistas da área.
O levantamento considerou não só os sintomas, mas o impacto no dia a dia. “Atrapalha a qualidade de vida. Sabíamos que era muito frequente, mas não tínhamos ideia de que quase metade da população apresentava (má digestão) – e quem mais sofre são as mulheres. Tínhamos o interesse em descobrir até para ajudar essa população”, diz Flávio Quilici, presidente da Federação Brasileira de Gastroenterologia.
A pesquisa, realizada em junho, mostrou que os sintomas causam prejuízos na vida pessoal e profissional para 93% dos entrevistados, que relataram sentir a qualidade do sono afetada (74%) e disseram que já apresentaram sintomas durante o horário de trabalho (70%).
Embora a azia, a sensação de queimação no peito, tenha liderado entre os sintomas, ficando entre 88% e 90% das respostas, o refluxo, quando o conteúdo do estômago volta para o esôfago e pode ser sentido na garganta, é o problema que mais causa desconforto. Ele foi apontado por cinco em cada dez entrevistados entre os problemas que ocorrem semanalmente.
Além dessas, a pesquisa também destacou outras reclamações dos pacientes que nem sempre podem ser associadas a problemas de digestão, como a tosse seca e o mau hálito. “Conseguimos ver que alguns fatores correlatos, como o sobrepeso e o hábito de fumar, pioram esses sintomas. E isso não escolhe classe social nem idade”, diz Quilici.
Perfil
Segundo ele, os dados permitem elaborar o perfil do paciente que tem problemas de má digestão no país. “É mulher, jovem e com sobrepeso – e, talvez, fumante. A mulher se preocupa mais com a saúde, mas os casos são mais frequentes entre elas. Não deve ser alimentar, porque o homem se alimenta pior. A mulher é mais sobrecarregada no ponto de vista social, ela trabalha e é mais importante no comando da vida familiar, porque trabalha diretamente na sua casa, na manutenção da qualidade de vida da família. Com os filhos, se preocupa desde ensinar a falar até a escola. Ela é muito mais sobrecarregada em responsabilidades do que o homem.”
Em agosto, a enfermeira Larissa Rodrigues de Oliveira, de 25 anos, recebeu um diagnóstico de refluxo. Ela procurou ajuda médica após medicar-se com antiácido, remédios para a garganta e o estômago, e não melhorar. “Estava sentindo muita queimação, principalmente quando acordava, engasgando. Tomei bastante antiácido, mas não estava resolvendo nada. Era uma queimação que parecia que a garganta estava inflamada, já cheguei a tratar pensando que era inflamação, gastrite.”
Larissa também tem sintomas de azia e acredita que seu problema de saúde está ligado aos hábitos. “No meu caso, tem relação com a alimentação, porque sempre me alimentei mal, nunca fui regrada nem comia nada saudável. Fumo há um ano, mas já diminuí bastante, é mais nos fins de semana.”
Agora, está tentando ter uma nova rotina e também perder peso, outro fator que contribui para reduzir os sintomas do refluxo. “Perdi 24 quilos e ainda quero perder mais oito. Mudei a minha alimentação, comecei a comer mais frutas e estou tentando diminuir as frituras, que era algo que eu comia quatro, cinco vezes por semana.”
Alimentos fritos ou gordurosos e refrigerantes lideram entre os produtos que desencadeiam os sintomas de má digestão. De acordo com Quilici, os hábitos justificam as diferenças regionais, considerando que o Nordeste lidera as queixas. “Sem dúvida, tem o clima. Sabe-se do hábito das pessoas que vivem na região equatorial de comer e descansar para fazer a digestão. Além disso, tem uma comida pesada, condimentada, com alimentos mais secos, como a farinha.”
Ele afirma que, com os dados divididos por região, será possível oferecer um atendimento mais específico aos pacientes. “Essa pesquisa trouxe para a gente base científica. A federação tem uma sociedade em cada Estado. Poderemos fazer um trabalho regionalizado, porque falamos em uma situação econômica diferente e um clima diferente em cada região.”
Tratamento
Uma alteração na voz começou a incomodar o economista e professor aposentado Frederico Mazzucchelli, de 71 anos, há cinco anos. Como sempre usou muito a voz, dando aulas e cantando em uma banda de rock e samba, acreditou que seu problema poderia ser resolvido por um otorrinolaringologista. “Nunca tratei adequadamente. Fazia exames nas cordas vocais e aparecia uma irritação. No último mês, piorou. Fiz quatro exames no otorrino e fui no gastro. Ele falou que isso era consequência do refluxo e tinha de atacar o problema pela raiz.”
Ele conta que não tem os sintomas clássicos, como a sensação de que o conteúdo do estômago está voltando, e nunca imaginou que poderia ter refluxo. “Para mim, é só na voz que tem as manifestações. Mas é chato, desagradável. Tenho ensaiado, mas não tenho cantado. Isso me causa frustração. Espero que melhore, porque achava a minha voz o máximo.”
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