Quando uma festa tem mais gente que o previsto, é comum botar água no feijão, para render. Mas isso só acontece quando o feijão é escasso, o que não é o caso de Saubara, produtora do grão em algumas lavouras temporárias. Assim, a cada dois anos, para suprir a chegada “imprevista” de quem volta à cidade apenas para votar, ao invés de faltar, é mais fácil ter sobras.
Localizada no Recôncavo, a 94 km de Salvador por via rodoviária e a menos de 20 km por via náutica, Saubara tem quase 1,3 mil eleitores a mais do que os habitantes calculados no Censo 2022. São 12.726 pessoas aptas a comer uma feijoada e votar, em um ou dois domingos de anos pares, enquanto o município contabiliza, oficialmente, 11.438 habitantes. O “excedente” de eleitores é o maior entre as 23 cidades baianas que apresentam esse fenômeno, ou seja, mais eleitores que moradores.
Os números foram constatados em um levantamento do CORREIO, que cruzou os dados de população do Censo 2022, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com os dados de eleitores de dezembro de 2022 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
O resultado chama ainda mais atenção pois, no Censo 2010, a quantidade de eleitores registrados no TSE em dezembro daquele ano só era maior do que a de habitantes na menor cidade da Bahia, Catolândia, no oeste, que também apresentou a mesma característica no Censo 2022. Ou seja, em 12 anos, essa discrepância subiu de uma para 23 cidades. Confira no final do texto a lista de municípios que registram a situação.
Mas por quê?
Cientista político e professor da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), Claudio André diz que é muito difícil que isso seja usado como argumento para se atribuir um erro de contagem habitacional por parte do IBGE. “Essas cidades têm histórico de grandes fluxos migratórios. Há uma prevalência de pessoas que mantém o domicílio eleitoral, mas vão viver em outros municípios. Isso costuma ocorrer também quando se tem grandes cidades próximas”, observa.
Urna modelo 2020 (UE 2020) foi usada pela primeira vez em 2022. Crédito: Foto: Daniela Branches/Rede Globo
Jaime Barreiros, professor e analista judiciário do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-BA), tem uma hipótese parecida. “Eu imagino que tem que ser levado em conta o crescimento das chamadas zonas urbanas, municípios vizinhos e os cidadãos com possibilidades de se deslocar pelas cidades e trabalhar em lugares diferentes de onde nasceram e viveram”.
De fato, algumas cidades da lista se destacam pela proximidade com grandes municípios. Por exemplo, Catolândia, a única cidade do oeste que apresenta esse fenômeno, já foi distrito de Barreiras e está a 42 km de lá. No sul, Barro Preto fica apenas a 30 km de Itabuna. O mesmo acontece no centro-norte, onde Antônio Cardoso está a 32 km de Feira de Santana.
Esses grandes municípios são, justamente, os que possuem bem mais habitantes do que eleitores. Em Salvador, por exemplo, são cerca de 2,4 milhões de habitantes e 2 milhões de eleitores, o que dá uma diferença de 400 mil pessoas, a maior diferença entre as cidades. Logo depois vem Feira de Santana, Vitória da Conquista, Camaçari e Juazeiro, que juntas com a capital baiana formam a lista dos cinco maiores municípios da Bahia.
Fonte: Correio da Bahia
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