Leitura fomenta intelectualidade e reduz tempo da pena de pessoas presas


“A leitura já faz parte das nossas vidas”, garante um homem que cumpre pena em presídio da região serrana de Santa Catarina, onde o projeto “Despertar pela Leitura” é desenvolvido em todas as unidades – Presídio Regional de Lages, Masculino de Lages, Penitenciária da Região de Curitibanos e Industrial de São Cristóvão do Sul – com a participação voluntária dos apenados. Pela leitura de cada obra, a pena a cumprir é reduzida em quatro dias.

Segundo a Lei de Execuções Penais, são três as formas de reduzir a pena. Pode ser pelo trabalho, estudo e leitura. Na remição por estudo, por exemplo, o condenado poderá diminuir um dia da pena ao completar 12 horas de frequência escolar. Em Santa Catarina, a proposta do Poder Executivo de desenvolver essas atividades no sistema carcerário é apoiada pela Justiça.

Titular da Vara Regional de Execuções Penais da comarca de Curitibanos, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), a juíza Ana Cristina de Oliveira Agustini entende que tanto a remição pelo estudo como pela leitura atingem seus objetivos, ao viabilizar o preenchimento do tempo do condenado com atividades que ajudam em seu desenvolvimento e, ainda, reduzem a pena. “A ideia de que os apenados podem melhorar através do estudo e da leitura é difundida em inúmeros países. No Brasil, estas propostas vêm sendo implementadas. A redução da pena é um estímulo a mais para que leiam e estudem.”

Além de uma forma reconhecida de fomento intelectual com potencial para melhorar amplamente as pessoas, a leitura permite o aperfeiçoamento profissional. “Espera-se que com isso, entre outras coisas, haja uma facilitação da reintegração social do apenado”, destaca a magistrada.

O projeto “Despertar pela Leitura”, como tantas outras atividades na área penal, também precisou passar por adaptações desde o início da pandemia. Antes, os grupos se reuniam em uma sala para escolher os livros, interpretar textos e ouvir as explicações feitas pela professora. Agora, ela envia por e-mail os textos que devem ser lidos, e os agentes penitenciários entregam o material individualmente nas celas.

No Presídio Regional de Lages (SC), a professora Andreia Regina Silva, formada em Letras e Direito, executa as atividades do projeto desde 2017. Ela consegue identificar nos participantes o gosto por determinado tipo textual e auxilia nas escolhas. Os apenados leem ficção, comédia, romance e drama entre outros gêneros. “Eles aprendem a ser mais críticos. Tive um aluno que evoluiu tanto na leitura, que encerrou o ano lendo livros extensos como O Código Da Vinci”, conta a professora. O ano de 2020 começou com 82 participantes e, no final, a turma já era de 120.

A receptividade ao projeto é grande. Um dos apenados diz que a leitura tem ajudado bastante. “Aqui os dias não passam. Lendo a gente distrai, e o livro acaba antes do tempo previsto”. Outro, que não tinha o hábito da leitura, mudou o discurso e diz que ler já integra seu cotidiano. Há ainda quem tenha melhorado na fala e escrita, como revela um dos apenados. “Tinha muita dificuldade de me expressar. Minha letra melhorou e a pontuação também”. Um deles faz planos para quando sair: “É um hábito que quero levar comigo. Vou estimular meus filhos a aprender e mostrar o quanto é bom.”

Em cada unidade existe um acervo de livros. No Presídio Regional, por exemplo, a biblioteca conta cerca de 300 volumes, alguns recebidos por doação da comunidade. As leituras são realizadas dentro de um período e, ao final, o apenado apresenta uma resenha sobre a obra, que é analisada por uma comissão. Cada obra lida possibilita a remição de quatro dias, com limite de 12 obras ao ano. O controle é feito pelo próprio presídio ou pela comissão, que emite um atestado de leitura onde consta o nome da obra, período de leitura e horas entre outras informações.  *CNJ